Em pouco tempo, os jogadores que passavam horas em suas salas ou quartos jogando seus jogos em consoles ou em computadores, sem a interação com outras pessoas que não fossem um colega, um irmão ou um primo sentado logo ao seu lado e dividindo o mesmo ambiente, agora são jogadores que podem, em um estalar de dedos, se comunicar com pessoas que jamais foram apresentadas, que falam línguas diferentes e que possuem culturas diferentes.

Essa interação gerou um problema que por muito tempo foi ignorado ou sequer encarado como um problema real, a ética e a moralidade em jogos online.

Com a voz que a internet proporcionou a muitas pessoas que às vezes, infelizmente, não tem o que acrescentar em uma conversa ou discussão, muitos jogadores ao redor do mundo acreditam que podem falar e propagar o que quiser em uma partida online, independentemente do que ou o que os jogadores presentes com o indivíduo em questão vão achar de sua opinião ou discurso.

Desde casos de bullying a discursos de ódio raciais, religiosos e homofóbicos, a internet, e especificamente o mundo dos jogos online, luta para que exista uma ética que possa implementar um ambiente limpo e favorável para todo tipo de pessoa. Os próprios jogadores também se esforçam para que exista uma ética nos jogos, que envolvem desde bom comportamento, companheirismo e atitudes positivas.

Com isso, vamos entender mais sobre o que vem sendo feito e o que ainda pode ser alcançado para que jogar online seja um sinônimo de diversão e não de exclusão social.

jogos

A segurança do anonimato: Criminalização do preconceito nos jogos

Não é de hoje que a cultura dos jogos vem fazendo parte da vida de milhões de pessoas. Se você tem até 40/45 anos agora em 2023, provavelmente os videogames tiveram grande influência na sua vida, tanto culturalmente como socialmente, ajudando a moldar inclusive suas opiniões e ações.

A cultura de como os jogos são jogados, porém, mudou muito para quem viveu a época de ouro dos games desde o fim dos anos 1980 até meados dos anos 2000. Desde a ascensão e queda das casas de jogos eletrônicos onde os fliperamas dominavam até o advento da internet, que fez com que tudo mudasse.

Com a ferramenta que possibilitou jogar online, a sua sala ou quarto passou a fazer parte de um ecossistema global, o que fez com que muitas pessoas misturassem conhecimentos sobre culturas e suas crenças. O que era um aprendizado e uma maneira de diversão para uns, tornou-se um paraíso para quem discorda ou sente desprezo por uma minoria específica, algo que, com o anonimato da internet, deu coragem e voz a pessoas mal-intencionadas.

Um dos pilares para que essas atitudes fossem espalhadas foi por muitos anos o anonimato dos gamers em partidas online, o que gerava uma espécie de “segurança” para que uma pessoa mal-intencionada pudesse agir de má fé com outros jogadores, propagando discursos de ódio e preconceito.

Em 2022, uma pesquisa feita pela Anti-Defamation League (ADL), organização não-governamental norte-americana, apontou que pelo terceiro ano consecutivo o assédio sofrido por jogadores adultos aumentou e permanece em níveis alarmantemente altos, gerando dados alarmantes.

Cinco em cada seis adultos (83%) com idades entre 18 e 45 anos sofreram assédio em jogos online e três em cada cinco jovens (60%) com idades entre 13 e 17 anos sofreram assédio em jogos multijogador online. Esses números representam mais de 80 milhões de jogadores adultos e quase 14 milhões de jogadores jovens, números impressionantes que mostram como a prática existe de forma muito discriminada.

Outra reclamação recorrente e alarmante é o ambiente misógino e machista que permeia os jogos online, reclamação de muitas mulheres que sofrem simplesmente por serem mulheres em um ambiente dominado pelos homens. Uma pesquisa do ano de 2021, publicada pela Reach3 Insights em parceria com a marca de eletrônicos Lenovo, 59% das jogadoras costumam não revelar seu gênero durante as partidas. A razão é para evitar o assédio. Muitas jogadoras simplesmente não jogam online com medo de ameaças e práticas abusivas por parte de outros jogadores, ou quando jogam é somente com amigos, em um ambiente seguro.

O tema da criminalização vem sendo abordado por diversos órgãos em conjunto com os governos de cada país, procurando alternativas para que as desenvolvedoras tenham mais pulso firme com práticas desse tipo, como moderadores em chats de jogos ao vivo e formas de denuncias de perfis de abusadores, inclusive com medidas judiciais para quem é reincidente em casos como este.

A própria comunidade gamer já vem trabalhando para banir esse tipo de jogador, gerando uma união entre jogadores e criando um código de conduta que possa banir esse tipo de jogador de vez.

Violência nos jogos e sua influência em jovens: Fato ou exagero?

Não é de hoje que a associação do crescimento da violência entre crianças e jovens é algo associado com os jogos de videogame, principalmente os jogos mais violentos como os de luta e os de RPG, que sofrem com acusações desde os anos 80.

Essa discussão sempre foi acalorada entre grupos específicos e foi usada politicamente para conquistar atenção e votos.

Esses grupos mais radicais associam a violência fictícia dos jogos com a capacidade de jovens terem mais inclinação a cometer crimes como os tiroteios nas escolas, principalmente com as novas tecnologias que tornam os jogos cada vez mais realistas. O atentado em Columbine em 1999 gerou muitas discussões, mas na realidade o argumento da violência dos jogos atravessando para o mundo real passa de uma falácia.

Especialistas apontam que há pouca ou praticamente nenhuma evidência de que jogos de videogame possam transformar crianças em cidadãos violentos.

Os estudos promovem que outros fatores contribuem muito mais com a criação de um ser humano menos empático com a sociedade do que os próprios jogos, como:

  • Ambiente escolar
  • Ambiente domiciliar
  •  Relação com os pais
  • Condição socioeconômica
  • Preparo e acompanhamento psicológico

tecnologias jogos online

Diálogo e limites podem ser a solução

Em um cenário como este onde a desinformação acaba reinando, estabelecer diálogos com os jovens e estabelecer alguns limites podem ser saídas para uma convivência mais harmoniosa.

A missão de educadores e pais deve ser informar e fiscalizar os jovens em jogos online para não criar sociopatas como mencionamos anteriormente, estabelecendo limites de horários e tarefas a serem cumpridas antes de jogar. Com isso cria-se uma responsabilidade e um senso de pertencimento, sabendo que sua recompensa será fazer o que gosta após suas tarefas.

Entender que os jogos, em sua esmagadora maioria, contribuem culturalmente para o desenvolvimento de crianças é uma grande chave para mudar o preconceito sobre a prática. O acompanhamento de adultos e o incentivo a jogos educativos, além de reações positivas ao jogo devem ser a regra.

A importância da restrição de idade e o controle parental

Vimos até agora que é comprovado cientificamente que os jogos não geram violência em crianças e adolescentes de modo a formar pessoas violentas e delinquentes. Mas existem certos limites que devem ser observados e respeitados pelos pais, que é o controle de crianças pequenas em jogos de violência gráfica extrema.

Uma criança de nove ou dez anos de idade provavelmente ficaria mais abalada com um jogo de terror extremo como Outlast e The Last of Us ou mesmo de atitudes violentas como GTA, por exemplo, por isso existem restrições de idade que devem ser respeitadas e observadas.

Assim como no cinema, os jogos possuem classificações etárias e podem ser:

  • RP - Classificação pendente
  • EC - Primeira Infância
  • E – Todos
  • E 10 + - Todos com mais de 10 anos
  • T – Adolescente
  • M – Maduro – Indicado para maiores de 17 anos
  • A – Adulto – Somente maiores de 18 anos.

É importante observar estas regras para que o desenvolvimento infantil e adolescente seja mais completo, sem esbarrar em problemas educacionais e gerar conflitos que podem ser prejudiciais ao indivíduo no decorrer da sua vida.

Conclusão

Com base no que vimos até aqui, podemos concluir a sociedade precisa encarar as formas de criação de seus jovens com mais atenção em outras formas de aprendizado do que apenas a crítica aos jogos, sabendo lidar com as novas tecnologias e respeitando não só as classificações etárias como também o desenvolvimento natural dos jovens em relação aos jogos.

Isso pode gerar pessoas mais empáticas no futuro, onde em um ambiente como os jogos online, preconceitos e discriminações não ocorram de forma alguma, já que ouve uma preparação maior na educação do indivíduo pelos pais e responsáveis.

Algo que pode ser pesquisado é o aumento do investimento em tecnologias e políticas públicas que deixem os crimes de internet também serem transferidos para ambientes de jogos e serem passíveis de punições mais severas, o que deve coibir que o bullying e o preconceito virtual aconteçam.

Por fim, medidas como o fim do anonimato, moderadores mais severos e as atenções ao banimento de jogadores que utilizam certas plataformas de forma prejudicial podem ser o grande ponto de virada que fará o ambiente online menos tóxico, garantindo que ele seja exatamente o que foi feito para ser, um lugar de diversão e aprendizado, sem preconceitos por opção sexual, gênero, cor, religião e sem espaço para a misoginia.